O pior do impacto da pandemia do novo coronavírus, a Covid-19, sobre a cadeia produtiva da mandioca já passou e o setor começa a se recuperar de forma gradual. É o que revelam os números apresentados pelo economista Fábio Isaías Felipe, pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA), instituição da Universidade de São Paulo (USP), na última reunião da Associação Brasileira de Produtores de Amido de Mandioca (ABAM), realizada por videoconferência.
“Realmente, os impactos iniciais da Covid-19 sobre o mercado parecem que foram superados. Aos poucos, a produção industrial vem dando sinais de aumento”, disse ele. Ressalva, no entanto, que os números atuais são melhores dos que os do início da pandemia, “mas ainda bem abaixo daqueles que foram observados no ano passado”.
Membro do Conselho Técnico-Econômico da ABAM e diretor da Associação Técnica das Indústrias de Mandioca do Paraná (ATIMOP), Sigmar Herpich analisa que o quadro atual é melhor do que os verificados entre abril e início de junho. “Acho que o pior já passou sim. Mas ainda não voltou aos números anteriores. Esperamos que a pandemia não traga mais nenhuma novidade negativa”, disse ele.
Roland Schurt, diretor da ABAM e agroindustrial em Goioerê, também comemora o fim da pior fase da pandemia. “A gente percebe que o pessoal está trabalhando com mais liberdade no campo. No ar livre é mais tranquilo. Na indústria estamos seguindo os protocolos desde a recepção da mandioca e a situação é quase que normal. E em relação ao mercado, algumas regiões do país voltou ao normal, outras ainda não se abriram totalmente”, diz ele.
NOVOS MERCADOS – O estudo “Conjuntura de mercado: raiz, fécula e farinha de mandioca” apresentado pelo pesquisador na reunião realizada na última sexta-feira (28) aponta que podem estar surgindo novos oportunidades de mercado para a fécula de mandioca. Uma, é a possibilidade do aumento das exportações e a outra a retomada de alguns setores que hoje utilizam o amido de milho.
As exportações da fécula estão sendo estimuladas pela taxa de câmbio. Além disso, a Tailândia, maior exportador de fécula de mandioca do mundo, aumentou os preços no produto. Mas, o aumento das vendas para o exterior beneficiará apenas as empresas que já exportam. “Estas fecularias vão expandir as exportações e aproveitarão a vantagem cambial”, aposta Sigmar Herpich.
A possibilidade de aumentar a exportação não chegará às empresas que nunca vendeu para outros países porque o mercado externo exige selos de qualidade e certificações que demoram a ser emitidos. “Quando a empresa for certificada o mercado pode ter mudado e aí não compensa mais”, analisa ele.
Schurt concorda. Além das certificações, diz ele, “a conquista de clientes lá fora não é fácil, leva tempo”. Mas acredita que, se houver maior regularidade de preço e de disponibilidade do produto, o Brasil poderia exportar mais fécula.
“A Tailândia veio buscar a rama no Brasil. E embora não tenha a mesma qualidade tecnológica dos nossos equipamentos, não tenha a mesma qualidade da fécula brasileira, tem regularidade de produção e preço e domina o mercado mundial. E isto acontece por que? Visitei a Tailândia e lá o setor tem o apoio do governo, tem um porto exclusivo para exportação e uma universidade voltada para o setor”, revela o agroindustrial.
O economista da USP diz que é difícil apostar quais seriam os novos mercados externos, pois “isso ocorreria pensando em longo prazo e desde que fizesse um bom trabalho de promoção comercial que possibilitasse ganhar novos mercados”. Mas, neste momento, aposta na União Europeia. O estudo do CEPEA, aposta que este ano as exportações estão indo muito bem e a expectativa é de que o que foi comercializado até agosto com o mercado externo deve superar tudo o que se exportou no ano passado.
MILHO – Outra aposta é a oportunidade de reconquistar mercados que foram ocupados para o amido de milho. O cereal está com preço, em média, 65% mais caro em relação ao ano passado, segundo Edmar Wardensk Gervásio, analista de milho do Departamento de Economia Rural (DERAL) do Paraná.
E explica que o preço do milho vem crescendo desde o início do ano em razão dos aumentos das exportações, impulsionadas também pela taxa de câmbio e a forte demanda interna para transformação em proteína animal.
As exportações de milho são realizadas pelo Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, mas ajuda na escassez do produto. A produção paranaense se destina mais para a avicultura e suinocultura.
Ano passado o preço da saca de 60 quilos do cereal era cotado entre 25 e 30 reais no Paraná e começou a subir no começo de 2020. No segundo semestre o preço disparou e atualmente está cotado em torno de 50 reais. Estes preços devem se manter nos atuais níveis, já que os dois estados exportadores, estão vendendo as safras de 2021 e 2022. Gervásio também acredita que isto pode abrir espaço para a mandioca no mercado de fécula.
Fábio Felipe avalia que neste momento é difícil precisar quais mercados seriam retomados pela fécula de mandioca em substituição ao amido de milho. Observa, no entanto, que “agora há uma transmissão de preço do milho em grão para o amido, algo que não ocorria. Além do mais, a oferta desse produto no mercado é bastante escassa. E, consequentemente, pode – vamos deixar claro que pode – haver uma migração de alguns setores para a fécula”.
Sigmar Herpich está otimista com a possibilidade e lembra que ela pode ser aproveitada por todas as empresas do setor. Acredita que os preços do milho se manterão em alta, abrindo a possibilidade de alguns setores migrar para a fécula de mandioca. A indústria de papel e papelão poderá ser uma das primeiras a fazer a migração, já que a fécula de mandioca, neste setor, tem uma eficiência de até 20% em relação ao seu concorrente. “Se o setor de papel migrar, várias outras migram também”, aposta ele.