É importante contar como ocorreu a evolução da conservação do solo para o cultivo de mandioca em solos do Arenito Caiuá, que fica na Região Noroeste do Estado do Paraná. Uma forma delas, é seguindo a linha dos trabalhos desenvolvidos por pesquisadores do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná – IAPAR-EMATER (IDR-Paraná).
Tratando-se de solo, uma das prioridades da pesquisa deve ser reduzir as perdas de terra – as quais chamamos tecnicamente de solo – e da água, que naturalmente costumam ocorrer após o revolvimento dos pastos por meio do preparo do solo com arações, grades pesadas e grades niveladoras, por exemplo. Esse tipo de preparo do solo ainda ocorre no Noroeste do Paraná, sendo facilmente identificado quando transitamos às margens das rodovias, onde podemos observar faixas de terra nas encostas, expostas ao impacto das chuvas; consequentemente sujeitas a perdas de solo pela erosão (Figura 1).
A respeito disso, um estudo publicado recentemente procurou analisar o potencial erosivo em Paranavaí e diferenciar a capacidade natural desses solos resistirem à força das enxurradas, associando o aumento do teor de areia da camada superficial do topo das encostas em direção a rede de drenagem às margens dos ribeirões. Na prática, esses resultados são visíveis nas imagens aéreas disponibilizadas pelo Google, sendo perceptíveis a maior ocorrência de sulcos profundos e voçorocas nas partes mais inclinadas e com maior teores de areia nas propriedades agrícolas (Figura 1).
Já em um artigo publicado recentemente, foi possível descrever que o não revolvimento desses solos em sistema de integração lavoura e pecuária por cinco anos consecutivos melhorou a Avaliação Visual da Estrutura do Solo (VESS) e proporcionou maior infiltração de água das chuvas. Pode-se notar que as raízes mantiveram os grãos predominantes de areia, sua estrutura granular, sendo mais agregado pelas raízes do pasto na camada de 0-10 cm de profundidade, e diminuindo os tamanhos dos agregados em blocos na camada de 10-20 cm de profundidade. Ou seja, foi verificado que não revolver o pasto pode ajudar a manter a camada superficial mais estruturada pelas suas raízes, que por sua vez, reduz os riscos de erosões (Figura 2).
Então, além das práticas vegetativas de se manter o solo coberto para a redução da erosão, cabe relembrar das discussões técnicas realizadas em 2010 sobre a utilização das práticas mecânicas de construção de terraços em nível, como barreiras físicas para reter o excesso das enxurradas de maiores intensidades nos seus canais. Essas discussões evoluíram para a publicação e disponibilização de tabelas atualizadas para espaçamentos entre terraços com plantio em nível, recomendando uma redução nos casos de plantio convencional e uma ampliação para os locais com plantio direto (Figura 3).
Com isso podemos perceber, por exemplo, que quando se planta mandioca sem revolver o solo, o indicado seria o plantio com plantadora sobre a palhada do pasto dessecado previamente com herbicidas. Agora, quando se trata da conservação do solo do sistema convencional – aquele em que se revolve o pasto, para o plantio direto sobre a palhada do pasto, sem mexer no solo – surgem questionamentos sobre a necessidade de correção da acidez e da adubação fosfatada no perfil do solo. Contudo, em 2005 foram gerados resultados de pesquisa sobre a eficiência da aplicação do calcário distribuído na superfície do solo de braquiária, que forma uma frente alcalinizante, promovendo a correção da acidez em profundidade. Já a resposta positiva da adubação com fósforo aplicado no sulco de plantio foi comprovada experimentalmente e publicada já em 1999, em dois solos com baixíssimos teores de fósforo no solo.
Atentando-se ao histórico de publicações, é importante notar que houve grande aprendizado desde as décadas de 1980 até 2020 em solos arenosos do Arenito Caiuá, após pesquisas sobre o plantio direto em pasto de experimentos de laranja e integração lavoura e pecuária. Nesses estudos foi comprovado a melhoria da qualidade do solo, sem comprometer a produtividade de frutos de laranja em pomares comercias, e aumento da produção bovina quando feito o manejo da altura de pasto, em sistema de integração lavoura e pecuária desenvolvidos na Estação Experimental de Xambrê.
Se ao longo do tempo os pesquisadores geraram informações sobre como melhorar o uso dos solos do Arenito Caiuá para a sua conservação e retenção da água, faltaria ainda informações técnicas a respeito do manejo. Em 2020, pesquisadores avançaram em publicar resultados de experimentos de campo mostrando que o plantio direto de mandioca em pasto não comprometia a produtividade de raízes de mandioca. Ainda, há necessidade de mais pesquisas para ajustar determinados detalhes operacionais, como a quantidade de palhada de pasto a ser deixada para o plantio direto de mandioca. Alguns destes aspectos foram abordados em 2018 em parceria entre Epagri, Iapar e Embrapa a na cartilha “Plantio direto de mandioca aspectos do manejo”.
Paralelamente, foi desenvolvido um experimento no Polo de Pesquisa em Paranavaí do IDR-Paraná, entre 2012 a 2019 – com resultados preliminares publicados em 2018 no XXVI Seminário do Programa de Iniciação Científica em Londrina -, que possibilitou caracterizar que o intervalo de pasto de quatro anos aumentou a matéria orgânica do solo, do carbono orgânico total, em relação ao intervalo de dois anos para o plantio direto de mandioca, quando comparados ao plantio convencional em sistema de integração lavoura e pecuária. Essa constatação contribui para o cultivo conservacionista de mandioca por meio do plantio direto em solos do Arenito Caiuá do noroeste do Paraná.
Compartilhando uma experiência pessoal agora: quando em eventos técnico regionais com a participação de mandiocultores, questionei o público se já estariam realizando o plantio direto de mandioca sobre a palhada do pasto sem revolver a terra, ninguém se manifestou. Porém, finalizada a apresentação técnica e durante a confraternização, informalmente os mandiocultores se manifestam com declarações espontâneas de que estão realizando o plantio direto; em pequenas áreas, para conhecer esse sistema. Considero isso um grande avanço, e ao mesmo tempo percebi que alguns mandiocultores estão querendo testar as técnicas do plantio direto antes de emitirem opiniões próprias, visto que alguns já estariam ampliando as suas áreas de cultivo nesse sistema de plantio.
Sobre as práticas conservacionistas publicadas (de terraceamento agrícola em nível, calagem superficial, adubação fosfatada no sulco e plantio direto sobre a palha dessecada do pasto) estas não estão sendo impostas aos mandiocultores de modo que venham a mudar rapidamente do plantio convencional ao direto. Esses conhecimentos, na verdade, estão sendo compartilhados e disponibilizados aos agentes que desenvolvem a mandiocultura regional com a intenção de despertar iniciativas de cultivarem parte da área agrícola destinada ao planto direto de mandioca.
O agronegócio mandioca com tecnologias para a produção de raízes e indústrias tecnificadas para a exportação de subprodutos dessa matéria prima, constitui uma das principais atividades econômicas para o Noroeste do Paraná. Naturalmente, as camadas superficiais desses solos arenosos foram protegidas pelos pastos, que oferecem maior proteção ao impacto das gotas de chuva, amenizando os riscos a erosão. Nesse contexto, deveremos manter o compromisso de divulgarmos e promovermos a prática do plantio direto de mandioca aos mandiocultores do Noroeste do Paraná.
Os resultados das pesquisas mencionadas estão disponíveis para consulta no link do ResearchGate (https://www.researchgate.net/profile/Jonez-Fidalski).