“Este ano vai ser diferente”. Esta foi a reação do presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Amido de Mandioca (ABAM), Paulo Lopes, ao comentar as dificuldades enfrentadas no ano passado pelas indústrias do setor e as perspectivas para 2023. “Foi um ano atípico”, acrescenta ele, referindo-se a 2022.
Os fenômenos climáticos (geadas, ventos, granizo, longos períodos de escassez hídricas e excesso de chuvas em outros) registrados em 2021 e 2022 reduziu a oferta de mandioca no ano passado. Além disso, o teor de amido caiu muito, o que provocou um aumento considerável nos preços da raiz, bem acima da inflação.
Segundo o CEPEA (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), instituição ligada à Universidade de São Paulo (USP), a variação do preço médio nominal da raiz em 2022 foi de 80,8%. Já a variação real (descontando a inflação) no período foi de 63,5%. No ano anterior, 2021, o preço da mandioca também havia tido uma variação para cima bastante significativa.
“A conta não fecha”, diz Lopes, já que os preços da fécula cresceram em índices menores: variação de 71,2% no preço médio nominal e 54,7%, deflacionado. Ou seja, os preços da fécula não cresceram na mesma proporção e as indústrias não conseguem repassar mais alta da matéria-prima. “Chegamos ao limite e já observamos que no Paraná e no Mato Grosso do Sul os preços se estabilizaram nas últimas semanas”, constata o presidente da ABAM.
Contribui para esta estabilização de preços as lavouras ainda não colhidas (“são poucas, mas o suficiente para atender a demanda”) e a colheita da próxima safra, que, devido a boa remuneração, deve começar em abril e maio.
No segundo semestre a oferta deve ser ainda maior, o que eventualmente pode provocar uma queda nos preços da raiz. “Mas não será como há três anos, quando os preços ficaram muito baixo. Se houver queda, ela não vai desestimular o produtor, que continuará sendo bem remunerado pela sua produção de mandioca”, analisa o agroindustrial.
Além disso, a previsão é de que a próxima safra seja melhor, com maior teor de amido, garantindo boa remuneração para o produtor e com mais oferta para as indústrias. Isto vai permitir que as indústrias comercializem a fécula sem o déficit verificado em 2022. “Não há espaço para aumento de preço lá na ponta”, explica o presidente.
PESQUISA – Criado em setembro de 2021, o Fundo de Pesquisa da Mandioca para o Centro Sul do Brasil (FDM CS BR) está finalizando sua formalização legal. O FDM, como é chamado, tem por objetivo financiar pesquisas de interesse da cadeia produtiva da mandioca. E este ano, com a legalização, poderá começar a financiar efetivamente alguns trabalhos.
“É um avanço importante para o setor”, comemora Paulo Lopes, com a possibilidade de o setor financiar as pesquisas de seu interesse. No topo da lista das prioridades a ser financiada estão a colheita mecanizada da mandioca e o desenvolvimento de variedades com modificações genéticas, cujas lavouras podem, por exemplo, receber o glifosato.
As duas propostas já estão em andamento. Ano passado uma indústria do interior de São Paulo lançou a colheitadeira Maná que, na avaliação do setor, pode ser melhorada, reduzindo perdas e aumentando a eficiência. É neste sentido e com o apoio do FDM que o Grupo de Trabalho (GT) constituído pela Câmara Setorial da Cadeia Produtiva da Mandioca, vai trabalhar, ou seja, na análise e sugestões para aperfeiçoamento desta máquina.
A outra proposta, a do desenvolvimento de uma variedade modificada geneticamente, está sendo trabalhada juntamente com a Embrapa Mandioca e Fruticultura. A ideia não é criar uma mandioca transgênica, mas uma variedade editada geneticamente, ou seja, em vez da introdução de uma sequência genética na planta, a edição genética “desligaria” pontualmente parte da sequência genética da própria planta.
A edição genética é mais rápida que uma eventual transgenia, seu desenvolvimento demandaria menos recursos e a possibilidade de sua regulamentação é infinitamente maior que uma variedade transgênica.
Em dezembro do ano passado a ABAM encomendou à Embrapa uma proposta para buscar esta edição. Até março deste ano a unidade de pesquisa deve apresentar a proposição.
A colheita mecanizada e uma lavoura em condições de receber herbicidas eficientes vem da falta de mão de obra para atuar nas lavouras da mandioca, explica o presidente da ABAM. “Precisamos avançar, temos dificuldade em conseguir mão-de-obra. Só a tecnologia pode ajudar o setor a se desenvolver”, finaliza ele.