Neste artigo, apresentarei alguns relatos de pesquisas, finalizadas e em desenvolvimento do IDR-Paraná, que de alguma forma abordam a qualidade do solo nos cultivos de mandioca. A ideia aqui é contar como as pesquisas desenvolvidas para a citricultura e integração lavoura e pecuária deram suporte técnico aos sistemas mais conservacionistas para o cultivo de mandioca em solos do Arenito Caiuá, na Região Noroeste do Estado do Paraná.
A princípio, temos como exemplo os experimentos desenvolvidos à campo na Estação Experimental de Paranavaí, entre o período de 1978 a 1988. Na ocasião, as análises foram realizadas em áreas com preparo convencional do solo – no qual se tomba a terra, sob condições de chuvas naturais e, como resultado, foram constatados dois cenários diferentes. Em um pasto com cultivo de mandioca, foi identificada a perda anual de aproximadamente 10 toneladas de solo por hectare. Já em pastos de braquiária e colonião, essa perda foi cinco vezes menor; cerca de 2 toneladas de solo por ano, publicados em 2016 por Gustavo Henrique Merten e colaboradores, no livro – sob o título Erosão no Estado do Paraná: fundamentos, estudos experimentais e desafios. Esses resultados possibilitaram alertar a comunidade sobre os riscos de erosão ao cultivarmos os nossos solos sem cobertura vegetal ou palhada.
Enquanto isso, as perdas anuais de água resultante dos escorrimentos superficiais das enxurradas seguiram quase a mesma proporção, 93 mm em mandioca e 27 mm em pastos. Junto à água escorrida dessas erosões, após a força do impacto das gotas de chuva sobre a superfície do solo, há a desagregação e transporte das partículas pelas enxurradas, das lavouras “morro-abaixo” em direção às redes de drenagem – os ribeirões e os rios. Essas partículas de solo são visíveis pela coloração avermelhada nos leitos dos rios após as chuvas, características inatas das argilas pelos óxidos de ferro, um dos agregastes desses solos.
Agora, tendo apresentado o contexto através desse caso, ficou mais fácil comentar sobre um conceito atual: a qualidade do solo! Se compararmos o solo com pasto ao solo após o cultivo de mandioca, através do preparo convencional, haveria a concordância de que esse tipo de uso e manejo piora a qualidade; isso significaria que deixaríamos esse solo às próximas gerações com capacidade produtiva menor do que aquela que nós recebemos. Essa é a constatação que os agentes e mandiocultores da nossa região manifestaram nos últimos anos, durante os eventos técnicos que participei como pesquisador da Área de Solo, representando o IDR-Paraná do Polo de Pesquisa Paranavaí, sobre como poderíamos melhorar a qualidade dos nossos solos para a cultura da mandioca pensando, também, no futuro.
Dando continuidade, vejamos as melhorias da qualidade do solo promovidas com o plantio de laranjeiras, realizados em três experimentos, avaliados entre 1993 a 2015, sem o revolvimento dos pastos para o plantio de laranjeiras (Figura 1). Essa foto da “grama mato-grosso” estampando a capa da Revista Brasileira de Ciência do Solo e ilustrou um artigo sobre a melhoria da qualidade física de um solo arenoso do Arenito Caiuá, do Noroeste do Paraná, tendo tudo a ver com os mandiocultores ao preferirem para arrendamento áreas com essa gramínea; visto que apresentam a melhor qualidade física do solo para o cultivo de mandioca, mesmo com baixa fertilidade. Após a etapa de calagem, adubações fosfatadas e outros nutrientes – se necessário, conforme os resultados das análises químicas de cada solo – cultiva-se mandioca, seguida da semeadura de pastos (geralmente braquiárias), completando o processo de reforma de áreas degradadas.
Ademais, outra constatação da melhoria na qualidade dos solos da nossa região foi confirmada pelo sistema plantio direto de pasto no outono e da soja na primavera, em sistema de integração lavoura e pecuária, realizadas desde 2010 (Figuras 2 e 3). Esses resultados foram publicados entre 2013 a 2021, divulgados em eventos científicos e durante a Live da Expotécnica 2020.
As publicações dos resultados das avaliações de solo desses experimentos, feitos em pomar de laranja e em sistema de integração lavoura e pecuária, possibilitaram comprovar que houve a melhoria da qualidade desses solos arenosos, proporcionada por não terem sido revolvidos com arações e gradagens; com a manutenção de cobertura viva do solo e palhada das gramíneas. Estas ações proporcionaram o aumento dos teores de matéria orgânica (Figura 3), melhor estrutura do solo, redução da compactação, refletindo na maior infiltração, retenção e disponibilidade de água para as plantas.
O plantio de laranjeiras em faixas de 2 metros de largura, no qual foi realizado o preparo do solo com aração e gradagem, mantendo-se faixas de 5 m de largura sem revolver os pastos – manejados posteriormente com roçadas mecânicas nas entrelinhas que transitam os tratores e pulverizadores – possibilitou a redução de 70% da área dos pastos. Isso permitiu a melhora na qualidade do solo e não comprometeu a produtividade de frutos de laranja, quando em comparação ao preparo do solo convencional em área total de pastos, em três experimentos de longa duração: Alto Paraná, Nova Esperança e Paranavaí (páginas 401-408: https://sbcs-nepar.org.br/wp-content/uploads/2020/02/anais-iii-rpcs.pdf).
Foi constatado também que o manejo da altura de braquiária Ruziziensis a 23 cm de altura e de braquiária Brizantha a 30 cm proporcionou a melhor qualidade física do solo em um experimento de integração lavoura e pecuária, com carga animal e disponibilidade de forrageiras para os bovinos. Tais resultados podem ser conferidos em (https://www.aen.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=85665), (http://www.idrparana.pr.gov.br/Noticia/Integracao-lavoura-pecuaria-no-Arenito-exige-atencao-altura-da-pastagem) e na página 14 (http://www.idrparana.pr.gov.br/system/files/publico/iniciacao-cientifica/publicacoes/XXVI-seminario-do-proici-2018.pdf).
Para concluir, considero interessante compartilhar que nas apresentações anteriores desses resultados, feitas em palestras, era comum o público participante solicitar pesquisas sobre a qualidade dos solos cultivados com mandioca. Alguns dos indicadores, que comparam os sistemas de preparo de plantio de mandioca em áreas de pastos na Estação Experimental de Paranavaí e em lavoura comercial em Alto Paraná, estão disponíveis na Revista Scientia Agraria Paranaensis em 2019, volume 19, número 4, páginas 324-333 e 383-388 (http://e-revista.unioeste.br/index.php/scientiaagraria/issue/view/1145/showToc). Entretanto, mais pesquisas dessa natureza precisariam ser desenvolvidas, a fim de definir a estabilização das melhorias da qualidade do solo em diferentes áreas e sistemas de plantios de mandioca na nossa região.